Retomei meu curso de História no segundo semestre do ano passado, iniciado em 2002.1. É importante ressaltar que nesse intervalo de seis anos, continuei as minhas “leituras históricas”, através de revistas, textos soltos, internet, TV, filmes, jornais e alguns livros. E digo mais, muito antes de minha introdução á Academia, a História me seduz desde sempre: quando criança lia meus livros da disciplina nas férias, antes mesmo do início do período letivo, e ia além: ficava sonhando em ler os livros e assistir aos filmes citados nas bibliografias dos textos didáticos (mas dar conta do colégio já me tomava tempo suficiente). Também, por sorte a minha, meu pai ganhou uma coleção inteira de livros de História, da Antiguidade á Contemporaneidade, edições de luxo com fotos inéditas, desenhos e mapas de época, e texto com riqueza de detalhes, as quais li “escondido” grande parte durante a minha adolescência.
De volta á sala de aula e com ela às discussões historiográficas, mais precisamente em um proveitoso seminário de Teoria I, “O extermínio dos judeus e o princípio da realidade” de Carlo Ginzburg, tive contato com diálogos textuais que fiz com Hayden White e Ginzburg, e suas divergências sobre as construções narrativas da História. O que mais chama atenção nos meus estudos é o ceticismo/ relativismo, defendidos por alguns autores e que podem ter conseqüências desastrosas. A crise historiográfica vivida em 1960/70 dá margem a uma teoria um tanto absurda, chamada “revisionismo”, difundida por Robert Faurisson, presente também em outras ciências. O absurdo o qual me refiro é qualquer teoria que possa vir a tomar forma historiográfica expressar quaisquer dúvidas sobre a existência dos campos de concentração nazistas, suas câmaras de gás e fornos crematórios, como defende a teoria revisionista. Contudo, não me abstenho apenas ao campo dos estudos históricos, basta lembrar de Richard Williamson, bispo católico que negou o holocausto no início do ano em questão, 2009.
Desde os meus 12, ou 13 anos, a vida pessoal de Adolf Hitler e seus seguidores, os judeus europeus durante o nazi-fascismo, dentre todos os aspectos sociais que precedem e vivenciam a Alemanha Nazista, me exercem um enorme fascínio (apesar dos pesadelos que me causavam). Talvez porque por mais que pesquise por ambos os lados (alemães x judeus), nunca chegue a compreender realmente como um número significativo de mentes de uma nação se voltaram e se uniram para legitimar o mal. É aparentemente ilógico. E aqui cabe citar Hanna Arendt e sua expressão “banalidade do mal”, criada na discussão sobre o julgamento de Adolf Eichmann, a qual a autora utiliza o termo para explicar que os contribuintes do regime se diziam “apenas estar no cumprimento de suas funções”, daí a naturalidade da viabilização do processo da “Solução Final”. Em minha opinião a maior barbárie da História.
Ao saber da existência da obra “O diário de Anne Frank”, por volta dos meus treze anos, fiquei em pavorosa. Ao descobri-lo uns dois anos mais tarde na biblioteca da escola, o “devorei” inteiro, um pedacinho a cada manhã. Mas confesso que fiquei um tanto quanto decepcionada, senti que faltava algo, o achei um tanto superficial. Penso que esperava mais.
Hoje, empolgada em adquirir cada vez mais informações que possam me incrementar o saber histórico, lendo a edição 62 da revista “Aventuras na História (set 2008)”, em momento de descanso, descobri Hélène Berr, que me trouxe a inspiração desse texto. Intitulada como “Uma outra Anne Frank”, na sessão “Memória”, essa personagem microhistórica me tocou. Hélène era uma jovem judia de 21 anos, de família francesa de várias gerações, estudante de literatura inglesa na Universidade Sorbonne, apreciadora de música clássica, musicista de violino. Moça erudita de boas condições sociais e financeiras. Assim como Anne, Hélène também escreveu um diário, por quase dois anos, mas com conteúdo (antevendo eu) mais denso. Talvez por ter mais maturidade que Anne, ou sensibilidade ao transcrever as emoções ou ainda pela influência de seus estudos, o pouco que eu pude conhecer de Hélène Berr e seus escritos (“O diário de Hélène Berr – Um relato da ocupação Nazista de Paris) me parecem transmitir maior identificação (sem desprezar o relato de Anne, de suma importância para a Memória). Hélène escreve suas memórias confiadas á sua cozinheira para que entregue ao seu namorado caso ela não o veja mais, pois tinha medo de que ele não soubesse o que ela pensava durante sua ausência (O rapaz havia partido para combater na Resistência). A família, abastada, poderia ter fugido, porém Hélène se opôs por achar tal atitude covarde diante daqueles que se encontravam expostos á sua mesma situação, mas que não dispunham de sua mesma condição financeira. Continuou então a viver o seu cotidiano “normal”, percebendo, infelizmente, aos poucos os infortúnios que acabaram por apanhá-la, utilizando-se da frase “nudez diante dos golpes esperados” para retratar sua imobilidade diante do momento atual, que ela já previa: “A monstruosa impossibilidade de compreensão, a horrível falta de lógica de tudo isso tortura o espírito. Mas não há nada que refletir, pois os alemães não buscam nem razão nem utilidade. Têm um objetivo: exterminar”.
Como não me identificar: Hélène era uma jovem comum, assim como eu e minhas contemporâneas, jovem, apaixonada, universitária, amante da música, inteligente, bem informada, intuitiva, atuante no seu meio social (ex: ajudou na adoção de crianças judias). Me identifico completamente com o seu medo da morte: “... toda minha vida desaparecerá subitamente, com todo o infinito que sinto existir dentro de mim”.
Como não admirar: solidária, sensível, erudita, com a suavidade do seu semblante se complementando á do seu interior, Hélène sai do anonimato para nos retratar as atrocidades nazistas, tornando-se assim personagem central através de relevantes relatos histórico-literários dos seus medos, anseios e frustrações, comuns á toda uma época e de inegável importância para a Memória, a fim de que “O horror, o horror, o horror” não torne a se repetir mascarado sob nenhuma outra forma de “normalidade”. A velha estória de que está “tudo bem”, quando não está, a permanência de uma sociedade hipócrita, onde todos colaboram a fim de beneficiar apenas parte dela, ou no caso específico do Holocausto: exterminar parte dela.
A dor ainda está presente, mesmo que se passem mil anos, acredito eu, imagine apenas sessenta, como agora. Interessante ressaltar que os judeus não costumam utilizar “holocausto” para a definição do suplício do seu povo pela ditadura alemã. Isso porque holocausto significa “purificar com fogo” (e era isso que Hitler pensava: “purificar” a Alemanha, mas e o que existia na Europa de 1940 para ser purificado?), por isso utilizam a palavra iídiche “Shoah”, que quer dizer “calamidade”. Faz todo sentido. No caso da França, o país de Hélène, há um bairro judeu repleto de placas nas fachadas das casas de antigos moradores vitimados pelos nazistas. Uma delas diz: “À memória dos 112 habitantes desse prédio, dos quais 40 eram pequenas crianças, deportados e mortos nos campos alemães em 1942”. Ainda assim com placas, monumentos e eventos ao redor do mundo em memória dos oprimidos pelo nazismo, há quem não “veja”, por ignorância como no caso dos imigrantes africanos recentes instalados nos arredores de Drancy (ex - campo de concentração nazista francês) ou por culpa, vergonha, como no caso dos alemães pós-guerra. E há quem “veja” muito bem, continuando a perseguir o povo judeu sob as mais descaradas desculpas como os conflitos entre palestinos e judeus, ou retardadamente sob os preceitos nazistas. Grupos neonazistas e até mesmo partidários da extrema direita francesa, para exemplificar. Um absurdo.
É triste? Sim, mas é uma memória que deve ser mantida a fim de orientar gerações presentes e futuras, que a dor indescritível desse acontecimento para a humanidade possa servir de exemplo a fim gerar sentimentos contrários á guerra, preconceitos, extermínios e quaisquer tipo de submissões entre povos: “A única experiência da imortalidade da alma que podemos ter com segurança é a dessa imortalidade que consiste na persistência da recordação dos mortos entre os vivos (Hélène Berr - foto)”.
Desde os meus 12, ou 13 anos, a vida pessoal de Adolf Hitler e seus seguidores, os judeus europeus durante o nazi-fascismo, dentre todos os aspectos sociais que precedem e vivenciam a Alemanha Nazista, me exercem um enorme fascínio (apesar dos pesadelos que me causavam). Talvez porque por mais que pesquise por ambos os lados (alemães x judeus), nunca chegue a compreender realmente como um número significativo de mentes de uma nação se voltaram e se uniram para legitimar o mal. É aparentemente ilógico. E aqui cabe citar Hanna Arendt e sua expressão “banalidade do mal”, criada na discussão sobre o julgamento de Adolf Eichmann, a qual a autora utiliza o termo para explicar que os contribuintes do regime se diziam “apenas estar no cumprimento de suas funções”, daí a naturalidade da viabilização do processo da “Solução Final”. Em minha opinião a maior barbárie da História.
Ao saber da existência da obra “O diário de Anne Frank”, por volta dos meus treze anos, fiquei em pavorosa. Ao descobri-lo uns dois anos mais tarde na biblioteca da escola, o “devorei” inteiro, um pedacinho a cada manhã. Mas confesso que fiquei um tanto quanto decepcionada, senti que faltava algo, o achei um tanto superficial. Penso que esperava mais.
Hoje, empolgada em adquirir cada vez mais informações que possam me incrementar o saber histórico, lendo a edição 62 da revista “Aventuras na História (set 2008)”, em momento de descanso, descobri Hélène Berr, que me trouxe a inspiração desse texto. Intitulada como “Uma outra Anne Frank”, na sessão “Memória”, essa personagem microhistórica me tocou. Hélène era uma jovem judia de 21 anos, de família francesa de várias gerações, estudante de literatura inglesa na Universidade Sorbonne, apreciadora de música clássica, musicista de violino. Moça erudita de boas condições sociais e financeiras. Assim como Anne, Hélène também escreveu um diário, por quase dois anos, mas com conteúdo (antevendo eu) mais denso. Talvez por ter mais maturidade que Anne, ou sensibilidade ao transcrever as emoções ou ainda pela influência de seus estudos, o pouco que eu pude conhecer de Hélène Berr e seus escritos (“O diário de Hélène Berr – Um relato da ocupação Nazista de Paris) me parecem transmitir maior identificação (sem desprezar o relato de Anne, de suma importância para a Memória). Hélène escreve suas memórias confiadas á sua cozinheira para que entregue ao seu namorado caso ela não o veja mais, pois tinha medo de que ele não soubesse o que ela pensava durante sua ausência (O rapaz havia partido para combater na Resistência). A família, abastada, poderia ter fugido, porém Hélène se opôs por achar tal atitude covarde diante daqueles que se encontravam expostos á sua mesma situação, mas que não dispunham de sua mesma condição financeira. Continuou então a viver o seu cotidiano “normal”, percebendo, infelizmente, aos poucos os infortúnios que acabaram por apanhá-la, utilizando-se da frase “nudez diante dos golpes esperados” para retratar sua imobilidade diante do momento atual, que ela já previa: “A monstruosa impossibilidade de compreensão, a horrível falta de lógica de tudo isso tortura o espírito. Mas não há nada que refletir, pois os alemães não buscam nem razão nem utilidade. Têm um objetivo: exterminar”.
Como não me identificar: Hélène era uma jovem comum, assim como eu e minhas contemporâneas, jovem, apaixonada, universitária, amante da música, inteligente, bem informada, intuitiva, atuante no seu meio social (ex: ajudou na adoção de crianças judias). Me identifico completamente com o seu medo da morte: “... toda minha vida desaparecerá subitamente, com todo o infinito que sinto existir dentro de mim”.
Como não admirar: solidária, sensível, erudita, com a suavidade do seu semblante se complementando á do seu interior, Hélène sai do anonimato para nos retratar as atrocidades nazistas, tornando-se assim personagem central através de relevantes relatos histórico-literários dos seus medos, anseios e frustrações, comuns á toda uma época e de inegável importância para a Memória, a fim de que “O horror, o horror, o horror” não torne a se repetir mascarado sob nenhuma outra forma de “normalidade”. A velha estória de que está “tudo bem”, quando não está, a permanência de uma sociedade hipócrita, onde todos colaboram a fim de beneficiar apenas parte dela, ou no caso específico do Holocausto: exterminar parte dela.
A dor ainda está presente, mesmo que se passem mil anos, acredito eu, imagine apenas sessenta, como agora. Interessante ressaltar que os judeus não costumam utilizar “holocausto” para a definição do suplício do seu povo pela ditadura alemã. Isso porque holocausto significa “purificar com fogo” (e era isso que Hitler pensava: “purificar” a Alemanha, mas e o que existia na Europa de 1940 para ser purificado?), por isso utilizam a palavra iídiche “Shoah”, que quer dizer “calamidade”. Faz todo sentido. No caso da França, o país de Hélène, há um bairro judeu repleto de placas nas fachadas das casas de antigos moradores vitimados pelos nazistas. Uma delas diz: “À memória dos 112 habitantes desse prédio, dos quais 40 eram pequenas crianças, deportados e mortos nos campos alemães em 1942”. Ainda assim com placas, monumentos e eventos ao redor do mundo em memória dos oprimidos pelo nazismo, há quem não “veja”, por ignorância como no caso dos imigrantes africanos recentes instalados nos arredores de Drancy (ex - campo de concentração nazista francês) ou por culpa, vergonha, como no caso dos alemães pós-guerra. E há quem “veja” muito bem, continuando a perseguir o povo judeu sob as mais descaradas desculpas como os conflitos entre palestinos e judeus, ou retardadamente sob os preceitos nazistas. Grupos neonazistas e até mesmo partidários da extrema direita francesa, para exemplificar. Um absurdo.
É triste? Sim, mas é uma memória que deve ser mantida a fim de orientar gerações presentes e futuras, que a dor indescritível desse acontecimento para a humanidade possa servir de exemplo a fim gerar sentimentos contrários á guerra, preconceitos, extermínios e quaisquer tipo de submissões entre povos: “A única experiência da imortalidade da alma que podemos ter com segurança é a dessa imortalidade que consiste na persistência da recordação dos mortos entre os vivos (Hélène Berr - foto)”.
Um comentário:
Sabe, esse teu comentário sobre a teoria "revisionista" me fez relembrar o que eu cheguei a pensar por dias. Que História, no fundo seria uma ilusão, uma invenção incerta, sempre uma proximidade de algo que porventura aconteceu e que sai de poucos e atinge a muitos[coisa que de fato é], simplesmente por que extingue o sentimento. Por vezes existe um sentimento pairando que muda nosso modo de ver um fato[por ex.: o holocausto]. Se nós temos que desnaturalizar, não via e/ou vejo[nao sei direito] outra maneira que levar ao plano sensitivo. Como você escreveu "que a dor indescritível desse acontecimento para a humanidade possa servir de exemplo a fim gerar sentimentos contrários á guerra, preconceitos, extermínios e quaisquer tipo de submissões entre povos". O modo como fazemos me parece fracassado. É triste sim pensar que alguem não acredita na existencia de tal atrocidade. Como podemos nos livrar desse sentimento sendo "objetivos" no oficio? Como chegar tão perto do que aconteceu[pesquisa] e não se manifestar? Por que não?
=/ isso ta um desabafo bobo.
No fundo, eu só quero uma solução mais eficaz pra ajudar as pessoas...
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